domingo, 28 de novembro de 2010

Um amanhecer para se lembrar.

           Por: Ricardo Oliveira
*falta revisão*

Sempre faz frio aqui no topo a essa hora. A brisa vinda do mar é mais forte aqui. As estrelas já começaram a desaparecer isso significa que está quase na hora do sol nascer. Depois que eu a conheci esse lugar se tornou especial, antes dela era apenas um lugar qualquer. Mas agora sempre que venho aqui me lembro dela.
Eu me lembro de quando eu a conheci. Estava escuro, e o bar lotado. Havia uma banda local tocando, era algum tipo de rock, mas um pouco mais moderno, eles tocavam bem. Eu estava sentado em uma mesa um pouco mais afastada do palco. Eu tomava uma cerveja e conversava com o dono do local. Um amigo meu, seu nome era Beto. Beto e eu conversávamos sobre qual o melhor diretor de todos os tempos. Enquanto ele defendia com unhas e dentes Scorsese, eu me segurava fiel a Coppola. Talvez fosse o tipo de discussão que não chegaria a lugar algum, mas nos entretinha com certa alegria.
Pude perceber que alguém tirava fotos da banda, alguém que se movimentava se parar, de um lado a outro do palco. Fiquei curioso e perguntei a Beto quem era tal pessoa. Ele disse que era uma fotografa que queria tirar algumas fotos do bar naquela noite.
-Seu nome é Ana. – ele me disse.
-Ela é daqui? – perguntei sem saber o porque do meu interesse nela.
-Não, na verdade eu não sei de onde ela é. Ela só me procurou perguntando se poderia tirar algumas fotos, eu autorizei e nunca mais a vi.
-Hmm, ele me parece bem bonita.
-Sim, e ela é. Está querendo conhecer ela é?
-Só curiosidade mesmo.
Instantes depois a banda parou de tocar. Ana veio até a nossa mesa.
-Seu bar é incrível!
-Muito obrigado, está se divertindo?
-Sim muito! Estou tirando fotos maravilhosas.
-Que bom. Este é meu amigo Pedro.
Eu a cumprimentei, e a convidei para se juntar a nós. Ela disse que não queria atrapalhar nenhuma conversa. Para minha sorte Beto teve que nos deixar para resolver um problema no caixa. Então eu disse:
-Agora estou sozinho, você não vai me recusar de novo, vai?
Ela então se sentou e disse:
-Você, realmente sabe como persuadir uma mulher.

Eu ri e pedi duas cervejas para nós. Enquanto bebíamos e conversávamos eu a analisava, e Beto estava certo ela era sim muito bonita. Era alta, magra, cabelos castanhos mas havia um certo tom avermelhado também. Uma pele muito branca, havia algumas sardas em seu rosto, não muitas apenas o suficiente para dar um certo charme. A roupa que ela vestia que me chamou mais a atenção, jeans, salto, uma camiseta branca que passava de sua cintura e por cima dela uma jaqueta de couro vermelha. Eu nunca fui muito de avaliar as pessoas pela roupa, mas neste caso estava claro que ela fazia parte desse movimento moderno que estava surgindo. Ela exalava uma certa aura de segredos, e por algum motivo eu queria descobrir todos.
-De onde você é? – Eu perguntei.
-Sou de São Paulo, e você?
-Já fui de muitos lugares, mas agora sou apenas daqui. – Talvez fosse uma resposta idiota de se dar, mas soou bem em minha cabeça.
-Apenas daqui? – Ela me questionou com um sorriso.
-Sim, daqui. Junto ao mar.
-Posso fazer uma pergunta indelicada?
-Nenhuma pergunta é indelicada quando feita numa mesa de bar.
-O que você faz da vida?
-Sou escritor, e biólogo.
-Como assim?!
-Hora, sou apenas escritor, com hobby em biólogo. Hora, sou biólogo com hobby em escritor.
-E como uma pessoa chega num ponto de tanta dualidade?
-Prometo que te conto se você me deixar fazer as perguntas agora.
-Certo, então me pergunte algo. – Eu estava me divertindo, e o sorriso em seu rosto me passou a estranha sensação que ela também estava aproveitando tanto quanto eu a situação.
-O que você faz da vida?
-Sou estudante de arquitetura e fotografa.
-Pelo visto seus interesses são bem menos diferentes que os meus. E o que te traz ao litoral?
-Férias e um certo desejo de ficar longe de tudo.
E assim ficamos conversando o resto da noite. Parece até que ela se esqueceu que estava lá para tirar fotos. Fosse lá qual a sua real intenção nossa conversa durou horas, horas que culminaram ao fechamento do bar. Beto praticamente que nos expulsou do lugar, mas estava tudo bem. Saímos felizes.
 Já do lado de fora eu acendi um cigarro, e ofereci um a ela, ela aceitou e deixou que eu o acendesse.
-Você está hospedada em que lugar?
-Hotel Albatroz, segundo andar, quarto numero quatorze.
-Com tanta informação assim quem sabe eu não te visite durante a noite.
-Você não ousaria entrar no quarto de uma dama na calada da noite, ou ousaria?
-Não, não costumo fazer mais essas coisas.
-É uma pena viu.
-Mas nunca recuso convites.
A lua estava cheia e a temperatura baixa. A brisa do mar se condensava nas janelas da rua. E o sol ameaçava de dar o parecer.
-Enfim, eu moro perto desse tal Albatroz, quer uma carona?
Ela aceitou, e eu a levei até o hotel. Quando chegamos, ficamos nos olhando por alguns instantes, até que finalmente eu lhe disse boa noite. Ela então abriu a porta da minha caminhonete e desceu. Deu cerca de dois passos, parou e voltou. Pegou uma caneta em sua bolsa e puxou meu braço. Escreveu neles alguns números e olhou para mim mordendo de leve seus lábios. Então ela me disse:
-Provavelmente amanha irei estar de ressaca, então se você souber de algum lugar para tomar um bom café me liga.
-E se eu não souber?
-Me liga mesmo assim.
Ela então me deu um leve beijo e saiu. Fechou a porta e me disse pela janela:
-Boa noite.

No dia seguinte eu liguei para ela, era cedo, mas eu não me importava. E esperava que ela também se não importasse.
-Bom dia. – Foi a primeira coisa que disse a ela.
-Nossa que horas são? Ah, bom dia.
-Você me perguntou sobre onde tomar café, então eu sei. Aceita tomar um café da manhã comigo?
-Bom, já que eu pedi, e você já me acordou, claro porque não? Me dê vinte minutos.
-Está bem, logo mais eu passo ai.
Trinta minutos depois eu estava do lado de fora do hotel. Liguei mais uma vez para ela e esperei mais alguns minutos. Então finalmente ela saiu, ela estava linda. Usava shortinho marrom, regata branca com estampa, e chinelo. Estava simples, mas mesmo assim linda. Eu estava a pé, o local não era muito longe de casa, então conseqüentemente também não era muito longe do hotel. O dia estava bonito, sol e nenhuma ameaça de chuva de horizonte. Um belo dia para uma caminhada. Cerca de cinco minutos depois chegamos ao café. Era pequeno e um pouco escondido. Assim que eu cheguei fui cumprimentar o dono. Já aproveitei para pedir dois sanduiches e dois cafés. Voltei então para a mesa.
-Você conhece todo mundo da cidade? – Ela perguntou.
-Não só conheço as pessoas de onde eu freqüento.
-Entendi.
Então nosso pedido chegou até a nós. Comemos e conversamos mais um pouco.
-Ontem você me disse que me iria contar, como havia se tornado escritor e biólogo. – ela me disse, enquanto tomava seu café.
-Eu disse isso?
-Não com essas palavras, más a idéia é essa.
-Bem, sou formado em biologia, na verdade minha especialização é biologia marinha.
-Tá e a parte do escritor?
-Calma, eu sempre escrevi. Então quando eu descobri que poderia virar pesquisador, eu percebi que poderia fazer um poucos dos dois.
-Simples assim?
-No começo não foi, tive que abrir mão de um vida de grandes conquistas e conforto, mas ao menos estou em paz comigo mesmo.
-Então é simples.
-De uma forma de outra, tudo pode se tornar simples, se você quiser.
-Tenho minhas duvidas.
-Então presumo que a sua vida é complicada.
-Um pouco, na verdade acho que em parte a culpa é minha.
-Então se você tem alguma culpa você muito bem mudar ela.
-Tenho medo.
-Medo do que?
-De fazer uma escolha errada.
-Fazemos escolhas o tempo todo, uma delas pode ser uma escolha errada. É natural errar.
-Talvez.
-Já terminou?
-Sim, e você?
-Também, quer ir a algum lugar?
-Então, eu queria tirar algumas fotos.
-Precisa de algum guia?
-Sim você conhece um? – Ela riu.
-Está olhando para ele.

Saímos e fomos até o meu apartamento pegar meu carro. E prometi que a levaria para lugares escondidos e pouco freqüentados. Passamos o dia visitando praias e tirando fotos. Logo percebi que natureza não era muito seu interesse. Ao final da tarde fomos para um quiosque. Onde ficamos assistindo a lua subir no horizonte até alcançar seu lugar de direito em meio ao céu noturno. Bebemos e comemos.
-Que tipo de coisa você escreve?
-Todo tipo de coisa, estou mais escrevendo poemas.
-Me recita um?
-Eu não guardo muito as coisas que eu escrevo, me desculpe.
-Mas você os escreve certo?
-Sim, e daí?
-Então você poderia lê-los para mim.
-Sim, isso eu poderia.
-Então porque não o faz?
-Porque eles estão em casa, bem guardadinhos.
-Você me mostraria?
-Claro.
-Então vamos!
Isso era algo que eu gostava muito nela. Ela era espontânea, e tinnha uma certa certeza em suas palavras. Sentia como se ela trouxesse vida ao meu dia. Paguei a nossa conta no quiosque, e fomos. Chegando no apartamento, eu mostrei a ela o local, e peguei alguns poemas que eu tinha. Enquanto ela lia no sofá eu peguei bebida para nós. E assim a noite foi se passando. Bebemos, lemos, fumamos, rimos e relaxamos.
-Seus poemas são quase todos sobre amor.
 -Sim, gosto de tratar sobre o amor.
-Então isso quer dizer que você tem muito amor, digo para se inspirar.
-Não, na verdade não. É um amor criado, algo que existe em mente, mas não no coração.
-Que mentira, essas palavras não são vazias.
-Talvez eu coloque algum sentimento escondido em cada uma delas.
-Então você ama alguém.
-A ultima pessoa que eu amei simplesmente me deixou alegando que eu não era o suficiente.
-Nossa, que vadia.
-Pois é no final eu pensava a mesma coisa. E você? Você ama?
-Amei, mas tudo tem um fim.
-Então você não acredita mais em amor?
-Acredito, mas tento não criar expectativas.
-São as expectativas que matam o ato de amar, né?
-Sim, esta é a mais pura verdade!
-Sebe, eu não quero que você vá embora hoje.
-Que, engraçado. Eu também não quero ir embora.
Então eu a beijei. Fosse pela bebida ou pela simples vontade, ela também me beijou. Nos beijamos por um longo tempo, bem no meio da minha sala. Ela se deitou no chão, e eu fui tirando sua regata, ela apenas se esticava, e de olhos fechados sorria. Eu beijei cada centímetro de sua barriga, e acariciei cada curva de seu rosto. E então propus que fossemos para a cama. Ela aceitou, e eu peguei no colo e fomos para o quarto. Lá ela me despiu, e eu terminei a árdua tarefa de tirar o que ainda havia de suas roupas. Quando ela estava em cima de meu corpo ela me disse.
-Você sabe que isso não quer dizer que nós nos amamos né?
-Não se preocupe com que isso quer dizer. Depois cuidamos disso.
E estas foram as ultimas palavras ditas naquela noite.

No dia seguinte eu acordei e Ana ainda dormia. Com cuidado eu sai da cama e fui fumar um cigarro na sacada. O céu naquela manhã estava cinza, nuvens pesadas cobriam quase todo ele e mal se podia ver o sol. Todo aquele clima matutino só podia significar uma coisa: chuva! Enquanto eu terminava meu cigarro, ela acordou e me procurou pelo apartamento, pude ouvi-la chamando pelo o meu nome. Finalmente ela me encontrou na sacada, ela me abraçou e repousou sua cabeça em meus ombros.
-Será que vai chover?
-Com certeza.
-Não quero ficar presa no hotel por causa da chuva.
Então eu me virei para ela e disse:
-O que você acha de ficar presa aqui?
-Me parece algo bem mais agradável.
Dito isso nós nos beijamos. Ela queria tomar banho e trocar de roupa. Então eu disse que a levaria ao hotel e que enquanto ela se arrumasse eu iria ao supermercado comprar algumas coisas. E assim fizemos. Quando nós chegamos ao hotel eu disse:
-Ontem eu te mostrei o que eu crio, hoje é a sua vez.
-Está bem, eu vou pegar meu computador, vou te mostrar algumas fotos.
Cerca de meia hora depois nós estávamos de volta ao apartamento. Eu havia comprado o suficiente para um café da manhã descente para nós dois. Enquanto comíamos a chuva veio, forte e torrencial, não parecia que iria dar trégua muito cedo. Aquele dia passou tão bem quanto o anterior, ela me mostrou algumas de suas fotos. Criamos até uma espécie de brincadeira, para cada foto eu tentava criar um enredo, apesar de boba ambos gostamos daquilo. Junto com a chuva a temperatura baixou, não muito, estava um pouco frio. O suficiente para ficarmos ambos juntos no sofá assistindo filmes. Nós passamos a tarde inteira assistindo filmes antigos. À noite, assim como a tarde, foi muito prazerosa, e acabou de mesma maneira que a noite anterior. Ela e eu, juntos na cama.
No dia seguinte foi ela que acordou primeiro, mas não se levantou, continuou deitada na cama. Seus olhos foram a primeira coisa que eu vi quando abri os meus.
-Sabe, eu nunca acordei ao lado de um homem dois dias seguidos.
-Me sinto honrado em ser o primeiro.
-Até quando você acha que poderemos fazer isso?
-Até quando a vida nos permitir.
-Até quando eu tiver de ir embora você quer dizer.
-E quando será isso?
-Acho que daqui a duas semanas.
-Então temos quatorze dias para passarmos juntos, quatorze dias felizes.
-Queria que fossem mais dias.
-E eu quero que você não pense nisso. Vamos deixar para encara a realidade no fim desses dias.
-Está bem. Droga, eu tenho que ir para hotel de novo.
-Tem mesmo? Que tal passarmos o dia pelados? Assim você não precisar pegar sua roupa no hotel.
-Minha vontade é de passar o dia inteiro nua aqui na cama com você.
-Mas tenho que pegar umas coisas na minha mala.
Foi então que eu tive uma idéia, contei a ela e ela aceitou. Ao meio daquela manhã ela havia saído do hotel e se mudado para o meu apartamento. Afinal de contas, não havia motivo para continuar pagando diárias se era em minha cama onde ela acordava todas as manhãs. Após essa mudança pudemos fazer as coisas com um conforto maior. Eu escrevia como nunca, estava cheio de inspiração, e não vou negar que ela a era a minha maior fonte. Enquanto eu escrevia, ela tirava fotos. De alguma forma Ana descobriu em meu apartamento um mundo totalmente novo para suas fotos, tudo era um motivo para ela, desde a luz que entrava pela janela, até como eu escrevia em meu computador. Claro que eu aproveitei para tirar fotos dela, fotos as quais eu guardo até hoje com um carinho especial, fotos que hora ou outra eu revejo, talvez para relembrar aqueles dias. Claro que saiamos de vez em quando, para dar um passeio ou até mesmo para irmos a praia. E assim os dias foram indo, cada um tão calmo e alegre quanto o anterior. Talvez o fato de que nós sabíamos que tínhamos um tempo limite juntos nos fez aproveitar da melhor maneira possível aqueles dias.

Creio que foi no penúltimo dia antes da tal data final em que eu a trouxe neste lugar. Era de madrugada olhei no relógio e eram quatro e meia, ela estava dormindo, mas eu cometi o pecado de acordar-la. Claro que o fiz gentilmente, cheguei perto de seus ouvidos e disse:
-Ei, acorde, quero te mostrar algo.
Ela que obviamente ainda estava meio grogue devido ao sono me fez repetir.
-Quero te mostrar algo. Um lugar na verdade.
-Como assim?
Ela já estava completamente acordada a essa altura.
-Você está aqui para tirar fotos certo? Vou te levar para tirar sua ultima e mais linda foto.
-Mas como? Ainda está de escuro.
-Você já viu um nascer do sol alguma vez?
-Sim já.
-Mas não como esse. Vamos, temos que chegar lá na hora certa.
-Está bem, se você diz. Alem do mais eu já estou acordada mesmo.
Ela se arrumou e eu também. Eram quinze para cinco quando fomos para estrada. Dirigi por cerca de quarenta minutos, enquanto eu dirigia ela não suportou e caiu no sono. Quando finalmente chegamos eu a acordei.
-Chegamos.
-Onde estamos?
-No ponto mais alto. Daqui não há nada que te impeça de ver o mar por completo. Agora é esperar.
Assim esperamos. Até que os primeiros rais de luz começavam a pintar o céu, em tons de amarelo e laranja o céu da manhã ia se formando. Um processo lento e que exigia paciência. Mas era um processo lindo. Juntos e abraçados testemunhamos o surgimento de um novo dia. Ela então me disse:
-Esta é a coisa mais bela que eu já vi.
-Eu te trouxe aqui, para que nossos momentos juntos possam ser lembrados em algo, algo que irá existir para sempre.
-Agora além de minhas memórias terei algo que irá sempre me fazer lembrar.
-Sim, eu nunca irei te esquecer.
-Nem eu irei te esquecer.
-Acho que a esta altura eu possa dizer que eu te amo.
-Eu também te amo. Criamos algo tão real. Não sei como vou me esquecer disso tudo.
-O amanhã irá nos punir por isso.
-Devemos estar prontos então.
-Sim, sabíamos que esse dia chegaria. Agora cabe a nós lidarmos com nosso coração.
E assim foi nosso ultimo grande momento juntos. Hoje duas semanas depois estou neste mesmo local, assistindo este mesmo nascer do sol. Mas hoje sinto algo diferente, uma vontade. Na verdade acho que vou visitá-la. 

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